Ninguém é promovido por ser esforçado - Verdades Corporativas #1
Ser o funcionário exemplar, ficar até tarde, dizer sim para tudo e resolver todos os problemas não vão garantir a sua promoção se não souberem quem você é.
São 10 anos de experiência no mundo corporativo. Long story short: comecei como trainee e cheguei a cargos executivos em estratégia reportando ao CEO em uma indústria química multinacional.
Vejo que a quantidade de influencers no LinkedIn e Coachs têm divulgado histórias romantizando uma jornada de crescimento profissional onde o excesso de relatos dão um tom de acessibilidade a cargos renomados.
Porém, quando você chega sem muitos privilégios no mundo corporativo é questão de sobrevivência fazer a meritocracia funcionar ao seu favor.
Um parênteses sobre privilégios:
Eu digo que se não fosse pelo apoio do Estado eu nem estaria aqui. Nasci em hospital público, estudei a vida toda em escola pública e na hora de entrar pra faculdade precisei ralar pra ganhar bolsa de cursinho e conseguir passar em Engenharia Química em uma universidade pública. Fui pra França e tive um duplo diploma por conta de bolsas do governo para depois de formado conseguir passar em um único processo de trainee de uma multinacional alemã.
Dentre meus privilégios, eu tinha sim galgado um caminho muito tortuoso e brigado com unhas e dentes que a meritocracia realmente funcionasse ao meu favor. Afinal ela é muito bonita — na teoria.
Ter um primeiro emprego estável era o sonho de qualquer família de classe média. Quando passei no processo de trainee, finalmente pude sentir um certo alívio, como se tudo até ali tivesse, de fato, valido a pena. Sou muito grato por todo o suporte, direto e indireto, que viabilizou esse sonho.
Voltando a jornada no mundo corporativo: Finalmente com meu primeiro emprego, percebi que a partir desse momento, eu estaria realmente andando de bicicleta sem rodinhas. Somente eu na pista, e ao que tudo indicava havia subidas cansativas para uma bicicleta sem marcha e descidas íngremes para freios gastos.
Foi ao longo dessa jornada que fui aprendendo e usando ao máximo a única ferramenta que não poderia ser comprada: determinação.
Pode até soar como um clichê motivacional de coach de LinkedIn, mas em um contexto onde quase tudo pode ser comprado ou indicado, eu só tinha uma coisa: determinação.
E foi com ela que estudei, tirei boas notas e conquistei o que ainda parecia possível com esforço e conhecimento — passar na melhor universidade do país (ou ao menos era isso que se dizia, porque, na prática, até o vestibular pode ser vencido mais por treino nos melhores cursinhos do que por inteligência ou conteúdo de fato).
Sempre me esforcei muito para ser o melhor e me destacar, não somente na escola, mas no trabalho também. E foi nesse momento que percebi que essa antiga receita de sucesso não funcionaria mais: Somente dedicação e conhecimento não me levariam para posições melhores remuneradas.
Então, pretendo começar essa newslletter com algumas lições que aprendi ao longo dessa jornada. Minha intenção é de fornecer espaço para aprendizado e troca. Eu decidi criar esse espaço para fornecer conselhos que um gestor realmente preocupado com seus colaboradores poderia trazer em uma conversa no corredor enquanto o café não esfria.
Todos estão sempre preocupados com suas prioridades, e nem todo gestor tem tempo ou interesse em compartilhar aquilo que o trouxe até aquela posição. Eu mesmo sentia isso, porém demorei para perceber o valor e impacto que essas conversas têm na vida de quem, assim como eu, também luta diariamente para a meritocracia funcionar. Depois disso, sempre me atentei para criar espaços para conversas oportunas e despretensiosas com aqueles que estavam ao meu redor.
Decidi nomear essa série como Verdades Corporativas pois quero, ao curso da memória e das experiências, que seja algo contínuo e com mais versões. Sendo assim, começo a primeira com alguns pontos que logo no início da carreira acabei percebendo:
“Você não será promovido(a) por performance e sim por visibilidade”
Se as pessoas certas não sabem seu nome, seu trabalho duro não significa nada.
No começo eram 11 trainees na mesma turma. Todos com suas competências acima da média e instigados desde o começo a lutar por uma posição efetiva pois o RH mencionava que “Não tinham certeza sobre as posições efetivas ao final do programa”.
Depois de um extenso processo seletivo de 4.000 candidatos para cada vaga, ainda não tínhamos garantia de estabilidade. Só para referência, a concorrência no vestibular de medicina na USP é de cerca de 125 candidatos por vaga.
Sendo assim, ali naquele cenário de disputa entre colegas, tentei capitalizar minhas habilidades e competências à meu favor. Haviam ali os ‘vendedores’ que faziam muito bem o trabalho de mostrar toda conquista, mesmo que pequena, à quem estivesse disposto a ouvir. De cara, percebi o valor disso, porém com minhas ressalvas, pois nunca me senti bem em sair por aí me gabando.
O diferencial foi saber para quem e quando eu precisaria me promover. A oportunidade surgiu na metade final do programa de trainee. Teríamos uma apresentação para o CEO e ali eu vi a chance de me destacar. Aprendi sobre seu estilo, perguntei para quem já havia apresentado algo para ele como gostava que fossem as apresentações e sobretudo me dediquei ao máximo para avançar o projeto que seria apresentado.
Como resultado, fiz uma apresentação assertiva, sem muito texto, em inglês e meu projeto era o mais próximo de ser concluído da turma. Foram algumas questões feitas e rapidamente respondidas sem rodeios e ao final do programa eu tinha garantido vaga no projeto mais importante que me rendeu uma posição para trabalhar diretamente com o CEO no ano seguinte.
Vejo que o diferencial aqui foi ter a assertividade de olhar para o público, nesse caso o CEO, e trazer o que ele gostaria de ver. Muitos alí se preocuparam em mostrar como seu projeto era ótimo com todos detalhes possíveis em apresentações cansativas para um CEO agitado.
Aprender a fazer com que as pessoas certas saibam seu nome e o impacto que você traz para a companhia é o caminho mais curto à promoção. A sabedoria está em saber o que e quando ser dito. Pois se não há rapport com o interlocutor, falar sobre conquistas que não sejam mensuráveis ou impactem o contexto de quem está ouvindo, não adianta nada.
Também acho que uma constante auto-promoção não é benéfica. Os gestores sabem e conhecem quando há interesse em compartilhar uma conquista por benefício mútuo ou individual.
O que pode ajudar é a reflexão: Essa conquista/melhoria/projeto tem algum impacto positivo direto ou indireto para aquela pessoa? Se sim, mostre. Se não, procure encontrar a relação que desperte interesse, senão vai soar mais como uma apelo por massagem no ego do que uma troca que pode abrir portas.
Nem sempre teremos uma apresentação importante na agenda, ou então alguma forma de mostrar os resultados em público. Sendo assim, precisamos estar sempre atentos a oportunidade pois não existe sorte. É necessário estar preparado para quando o cavalo branco passar na nossa frente conseguirmos laçá-lo.
“Sorte é quando a oportunidade encontra a preparação” - Seneca
Nesse quesito, estar preparado significa performar bem, fazer seu trabalho bem feito e um pouco a mais do esperado (sair da média). Sobre a oportunidade podemos esperá-la ou então criar meios para que ela se aproxime, sendo esse último mais ágil.
Sendo assim alguma sugestões bem pragmáticas para criar oportunidades:
Convide sua liderança para mostrar seu trabalho
Crie momentos que você possa interagir diretamente com sua liderança. Não espere que ela pergunte sobre tudo e chegue a conclusões sozinha, mostre o que você fez e o impacto.
Se fizer algo além do seu escopo, então seja estratégico
Encontre nessa troca um ganho, seja através de exposição para outros gestores ou então para estar visível em outros círculos de interesse
Converse com outros gestores
Se não houver assunto sobre a área ou função, comece perguntando sobre sua trajetória, todo mundo gosta de contar histórias, principalmente quando somos protagonistas. Nesse momento há espaço para trocas além do óbvio.
Encontre seu estilo para se destacar
Seguir o rebanho trás segurança, porém não te leva a nenhum lugar diferente de onde todos estão indo. Criar uma marca pessoal que te diferencie positivamente da multidão é uma forma de ganhar evidência.
Prepare um substituto (se possível)
Nenhum gestor vai te promover se não houver ninguém para te substituir. Preparar um estagiário ou alguém mais sênior (no caso de uma liderança) é ponto chave para garantir sua promoção.
Esses conselhos se aplicam a todos os níveis da organização, inclusive gestores, afinal todo mundo tem um chefe. No nível de gestão é necessário um policiamento maior sobre como as oportunidades são criadas de diferentes formas para diferentes cargos.
As arenas políticas ficam cada vez mais complexas e o trabalho para gerar visibilidade sobre sua área e consequentemente seus resultados se torna um mecanismo de sobrevivência. Estude com cuidado as relações políticas e trabalhe ativamente para não ficar somente entregando sua meta.
Os diferentes níveis exigem diferentes formas de mostrar impacto para companhia. Entender esse contexto é chave para que o esforço não seja negligenciado por uma falta de atenção na promoção dos resultados.
Somente entregar a meta ou ser o melhor colaborador não funciona, as pessoas precisam saber que esse impacto é seu e somente você é responsável por isso.
Não deixe o cavalo branco passar.
Recomendo algumas leituras sobre o tema:
"Managing Up: How to Move up, Win at Work, and Succeed with Any Type of Boss" – Mary Abbajay
Um guia prático sobre como adaptar sua abordagem para diferentes estilos de liderança e influenciar seu chefe positivamente.
"Brag! The Art of Tooting Your Own Horn Without Blowing It" – Peggy Klaus
Guia prático para falar sobre suas realizações sem soar arrogante.
"As Armas da Persuasão" – Robert Cialdini
Mostra como usar gatilhos psicológicos para persuadir e ganhar influência dentro das organizações.